Por Marcus Granadeiro
A migração dos processos tradicionais da engenharia para o BIM (Building Information Modeling) não se dá de forma súbita, pois este processo está mais para uma jornada do que para um projeto. Pensando de forma mais moderna, trata-se de ondas de implantações com sprints sucessivos que formam a trajetória de transformação.
Neste caso, cada movimento, cada sprint e cada onda pode durar muito e demandar esforços e recursos. Quem já tentou apenas modelar ou simplesmente compatibilizar projetos ou até mesmo focar somente no processo de orçamentação e planejamento sabe bem quão complicado e difícil é. Um passo que parece simples, normalmente pensado como aquisição de um software, treinamento e desenvolvimento de um piloto para ganhar experiência, frequentemente se mostra mais complexo e, eventualmente, fica inacabado ou mesmo gera algum tipo de frustração.
Dentro desse contexto, a concepção de uma estratégia de implementação de BIM é fundamental e deve estar alinhada com objetivos de negócio, ou seja, pensada para ser viável dentro da realidade da empresa e necessária para evitar que a organização fique fora do mercado. Entender as ondas e suas diversas iniciativas dentro do contexto da estratégia, acompanhá-las e revisá-las passa a ser uma das responsabilidades chaves no contexto da transformação digital.
Infelizmente, um erro muito comum, é confundir uma onda de implantação, normalmente a primeira, como toda a jornada completa e, pior, é entender o BIM como se fosse um “check” necessário para atender um requisito de algum cliente ou do mercado. Empresas que fazem isso podem até já ter avançado e colhido algum benefício ou desfrutado de algum status. Porém, em pouco tempo, ficarão para trás e talvez já sem tempo para se recuperar.
A grande maioria das empresas e o próprio decreto do governo sobre BIM, que entrou em vigor no ano passado, optaram por iniciar a migração pela área de projetos modelando, realizando compatibilização, extraindo quantitativos e gerando documentação de forma automática. A primeira parte desta onda normalmente é a mais simples: basta selecionar um software, comprar ou alugar a licença, receber um treinamento e iniciar a modelagem com ele. As dificuldades vão aumentando com a necessidade de maiores detalhes, que requerem precisão na informação para que o orçamento saia de forma correta, compatibilização com os planejamentos e, principalmente, coordenação em diferentes modelos realizados por diversos profissionais em distintos sistemas.
Pensando em termos estratégicos, faz sentido todos os players do mercado iniciarem por projeto? Não. Obviamente, para o grupo que desenvolve projetos executivos sim, mas para os stakeholders clientes do projeto, certamente não. Esses, caso tivessem discutido melhor sua estratégia BIM, fatalmente optariam pela fase de planejamento e definição de produto, obra ou até mesmo operação, fases com melhores retorno para eles em termos de custo, qualidade e risco.
Então, é possível iniciar uma jornada BIM sem que seja pela fase de projeto? Sim. Precisamos entender que BIM é processo muito mais do que modelagem. Claro que é fundamental ter um modelo para usá-lo como lugar geométrico da informação, mas a parte mais complexa é ajustar o processo para que não ocorra duplicidade ou quebra do fluxo de informação e registros. O BIM, sem digitalização dos processos correlatos, não acontece de forma plena.
E quando pensamos no decreto federal, que impõe às empresas a implantação da fase de projeto, contabilização e orçamento utilizando o BIM a partir de janeiro deste ano, devemos considerar que os desafios para esse passo são enormes. Muitos já avançaram, fizeram pilotos, entenderam como fazer e precisam agora colocar em produção. Outros ainda estão buscando finalizar. Infelizmente ainda há muito BIM “para inglês ver”, pois todo o processo e desenvolvimento está sendo realizado de forma tradicional e o modelo sendo desenvolvido por fora para entregar ao cliente e cumprir o requisito. Fazer desta maneira parece mais cômodo, dá a impressão que custa menos, mas não é verdade. Quem está fazendo desta forma está cavando sua sepultura e, em breve, estará completamente fora de condições de competir com o mercado.
Vale destacar que este mesmo decreto estabelece o gerenciamento de obras em BIM até 2024. São três anos até lá, porém os desafios na implantação desta fase são bem maiores. Os processos a serem alterados são mais complexos, pois haverá mais stakeholders envolvidos, mais tecnologias e mais custo. Nessa fase, a chance de se perder nas implantações, caso a estratégia geral não esteja clara para todos, é enorme. Por isso, há a necessidade de se ter clareza de objetivos para tomar decisões de vulto que envolvem grandes desembolsos e riscos. Ou, a pior decisão, é não fazer nada. E essa, normalmente, é a pior delas.
Marcus Granadeiro, presidente do Construtivo