Pesquisa inédita revela que 55% dos paulistanos dividiriam espaços em imóveis

No início desta década, se alguém afirmasse que o número de pessoas que deixaria os carros na garagem, priorizando o transporte público – como táxis, carros de aplicativos, bicicletas e patinetes elétricas- muitos iriam descartar tal projeção. Se alguém entrasse nesse conceito “menos é mais” em relação às moradias, indicando que muitas pessoas prefeririam morar, cada vez mais, em residências compactas, priorizando a qualidade de vida, o “visionário” seria taxado como alguém fora da realidade.

Hoje, apenas dez anos depois, com o crescimento da economia colaborativa e disrupção digital, é impossível não pensar em uma sociedade cada vez mais adepta aos modais de mobilidade urbana e aos imóveis compactos, que por sua vez, são compensados por serviços de compartilhamento de carros, bicicletas, lavanderia, etc. Quem acha que a mudança de comportamento da população, em relação ao estilo de vida e consumo, acaba por aí, engana-se: adentramos na Era dos Colivings – compartilhamentos de espaços comuns, recursos e atividades diárias dentro de uma casa- e os próximos anos vão revolucionar ainda mais a forma de morar em sociedade. Haverá pessoas, cada vez mais, dividindo espaços de sua residência com outros moradores desconhecidos, que buscam economizar nas despesas de aluguel, mas ter serviços compartilhados de acordo com sua filosofia de vida e faixa etária.

A projeção acima faz parte da pesquisa “Movimento Coliving”, encomendada pela construtora Vitacon junto ao Instituto Ipespe, realizada em São Paulo, entre os dias 14 e 19 de fevereiro, com 800 pessoas, de ambos os sexos e idade acima de 16 anos. O objetivo é entender como o brasileiro se coloca diante da alternativa de morar em uma residência compartilhada.

Enquanto quase um terço dos entrevistados (31%) aceita compartilhar espaçoscom pessoas desconhecidas ou conhecidas na mesma residência a longo prazo, para 55% dos entrevistados, viver em imóveis compactos e em áreas de convívio compartilhadas, como sala de estar, café, escritório e lazer, ou seja, morar no conceito coliving, já é uma realidade.

“Ao considerarmos São Paulo como uma capital de tendência para outras cidades brasileiras, podemos afirmar que 60 milhões de brasileiros já aceitam morar em imóveis com espaços compartilhados, eque mais de 100 milhões de brasileiros estão dispostos a morarem em colivings nos próximos anos”, projeta Alexandre Frankel, CEO da Vitacon e Embaixador da ONG Co-liv na América Latina.

Embora 89% dos entrevistados declarem estar satisfeitos ou muito satisfeitos com a moradia atual, alguns pontos da pesquisa podem ser levados em consideração para que a opinião tende a mudar nos próximos anos: a estabilidade financeira.

Segundo a pesquisa, a grande maioria tem imóvel próprio (68%), enquanto quase um terço da população paga aluguel (27%). Entre os mais ricos, apenas 8% paga aluguel, enquanto 35% dos mais pobres fazem o mesmo.

Para os que considerariam morar em coliving, a principal vantagem é a econômica – seja para os jovens ou os mais velhos. O gasto com aluguel chega a comprometer de 30% a 50% da renda mensal, para 27% das pessoas entrevistadas. Seis a cada dez entrevistados acima de 60 anos fazem o mesmo.

A segunda vantagem de compartilhar espaços dentro de imóveis está associada diretamente à necessidade de socializar com outras pessoas (networking), e também a uma forma de não se sentir solitário dentro de uma casa.

Pessoas ao redor do mundo estão solitárias, e a tendência é que fiquem aindamais até 2030. No Brasil, entre2005 e 2015, o número de pessoas que moram sozinhas saltou de 10,4% para 14,6%, sendo que a grande maioria tem acima de 50 anos. Comparando com outros países, como Reino Unido, Noruega e Alemanha, os brasileiros não são tão solitários assim, por estes países já terem ultrapassado 30% de residências com moradores individuais. “Enquanto os mais jovens querem morar no coliving por acessibilidade e condição financeira, as pessoas mais velhas têm essa necessidade devido à solidão”, explica Frankel.

Ainda existe um “oceano azul” a ser explorado dentro do universo do coliving e alguns conceitos precisam ainda ser trabalhados com a população e os mais conservadores. Entre as desvantagens apontadas, destaque para a falta de privacidade e a “bagunça” feita por terceiros em ambientes compartilhados, sendo praticamente unanimidade em quase todas as faixas etárias.

Tendências para os jovens e mais velhos

Ao analisar sob a ótica de que uma pessoa com 45/50 anos hoje é o futuro da terceira idade em 2030 e estará junto com quem, atualmente, já faz parte deste grupo – acima de 60 anos – , a pesquisa indica algumas tendências para os colivings no Brasil.

O pré conceito sobre morar em apartamentos com espaços compartilhados ainda é alto, quando pensado em longo prazo, sendo que apenas 1/3 dos entrevistados adotariam este novo estilo de vida. “Os jovens são os mais engajados, mas chama a atenção o grupo de 45 a 55 anos, que diz conviver, conhecendo ou desconhecendo pessoas a longo prazo, sendo sua totalidade de 29%. É praticamente o mesmo percentual do grupo de entrevistados entre 25 e 44 anos”, analisa o executivo, que destaca: “É um grupo que sabe que estará mais solitário daqui a 10 anos, e já prevê morar em algum tipo de coliving no futuro”.

Estima-se que, nos próximos anos, o mercado de colivings seja bastante explorado para perfis segmentados:ao escolher o tipo de pessoa, podendo optar por mais de um perfil com quem compartilharia os espaços, prevaleceu famílias (42%), seguido por terceira idade (28%), mulheres solteiras (19%), casais (18%) e homens solteiros (5%).

Justificando que brasileiro gosta de cozinhar de forma individual, 57% entrevistados disseram que cozinha não se compartilha. E, se for dividir espaço com pets dos outros, 33% não aceitaria nenhum tipo de animal, e 33% somente se permanecesse em espaços privados. “A geração dos millennials é mais flexível neste ponto, e quandofazemos a análise de forma mais qualitativa, entendemos que os colivings somente farão sucesso no Brasil quando trabalhado de forma personalizada para comunidades”, prevê Frankel.

Coliving 3.0

O futuro da convivência a partir de 2030 já tem chamado a atenção da indústria dos colivings. De acordo com o projeto colaborativo ONE SHARED HOUSE 2030 , a tendência é queum terço da população mundial adote o conceito de coliving e compartilhamento ao seu estilo de vida, pois viver em comunidade sempre será a solução para diminuir o alto custo de vida e a solidão.

Gui Perdrix -um dos especialistas em colivings mais respeitados no mundo e vice-presidente da ONG Co-Liv, também tem falado bastante sobre tendências mundiais focadas no conceito de morar em residências com áreas compartilhadas.

Atualmente, empresas têm buscado investirem uma comunidade composta de jovens ou nômades digitais, atraindo-os pelo design e decoração destes espaços ou pela vantagem econômica. Porém, para o expert francês, empresas devem ter uma outra leitura sobre o comportamento destes clientes “Os locais geralmente não pensam na questão mais fundamental: saber como o coliving pode se tornar uma escolha de vida a longo prazo”.

Mesmo sem a sociedade ter se adaptado com o conceito 1.0 e 2.0, para Perdrix, o Coliving já está na versão 3.0, emborasejam necessárias melhorias e adaptações para que o modelo passe por uma verdadeira transformação, tornando-se mais popular. “Isso precisa ser entendido a partirde um sentimento de propriedade, adaptabilidade, acessibilidade, segurança e inclusão”, explica.

De acordo com a ONU, em 2030 67% da população mundial estará nas cidades em comparação com 50% em 2007. Mais residências urbanas serão demandadas. Atualmente, 80% da demanda dos usuários de colivings vêm de trabalhadores migrantes. “O Coliving 3.0 tratará de criar a sensação de “casa” – e potencialmente “casa em todos os lugares”. Daí a importância da propriedade e da individualidade, mas também da escalabilidade e da cooperação governamental”, projeta o especialista.

Seguindo estudos sobre moradias com espaços compartilhados, considera-se que, para o custo de um coliving ser acessível, não deve representar mais que 30% da renda do cliente. “Ainda não chegamos neste números, mas a tendência é que o movimento caminhe nesta direção”, conclui.

Número de Colivings

• 800 marcas no mundo

• De 500 leitos em 2015 para 3100 em 2018

• Até 2021, crescimento de 84% (em construção)

• Os cinco principais operadores atraíram 3,7 bilhões de dólares